OS PRIMÓRDIOS DO ISLAM

Para entendermos o Islam e o conceito islâmico de vida, é preciso, em primeiro lugar, recuarmos na História em alguns séculos e buscarmos nas suas origens todo um código de vida que permanece até os nossos dias. Ainda que inicialmente a mensagem tenha sido revelada na península arábica, sua linguagem é universal. Antes de mais nada, para nós muçulmanos, Islam é submissão, submissão à vontade de Deus e o Alcorão é a palavra de Deus, conforme revelada ao Profeta Mohammad há 1.400 anos atrás.

O Islam surgiu na Península Arábica no início do século VII, com as primeiras revelações de Deus ao Profeta Mohammad, por intermédio do anjo Gabriel:

“Lê, em nome do teu Senhor, que te criou; criou o homem de um coágulo; lê, que o teu Senhor é Generosíssimo, que ensinou através do cálamo. Ensinou ao homem o que este não sabia.” (96:1-5)

 

Durante 13 anos as revelações foram sendo transmitidas e organizadas até serem sistematizadas sob a forma de um livro, de acordo com a orientação do Profeta Mohammad, que determinou a ordem dos capítulos e versículos.

 

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Este livro é o Alcorão, o Livro Sagrado dos muçulmanos.

 

O Alcorão, na verdade, é um conjunto de advertências, sugestões, injunções e princípios religiosos, morais, éticos e jurídicos que regem a vida de todo os muçulmanos.

 

Os árabes estavam organizados da mesma forma por toda a península. Não havia grandes cidades e eles viviam em pequenos grupos, unidos por laços familiares. Sociedade caracterizadamente patriarcal, as famílias estavam organizadas em clãs e os clãs formavam tribos. Portanto, todo árabe era membro de uma família, que pertencia a um clã, que, por sua vez, formava uma tribo.

O deserto da Arábia, extremamente árido e pobre, não propiciava muito o que comer, a vida era incerta e perigosa e, no geral, eles eram de temperamento esquentado. A qualquer tempo, um clã podia ser invadido por seus vizinhos. Emboras esses ataques repentinos rendessem alguns ganhos, eles eram motivados muito mais pelo espírito de aventura. Se um membro de um clã ou de uma tribo fosse morto numa luta aberta ou numa emboscada, isto podia render o envolvimento de todo o clã por anos a fio.

 

Distantes dos grandes centros culturais da época (Pérsia e Bizâncio), os árabes desenvolveram sua própria cultura, baseados nos costumes de seus ancestrais. Provavelmente a vida no deserto devia ser monótona e, para compensar esta falta de encanto, eles se dedicavam às guerras entre as tribos. Normalmente, as guerras não tinham por objetivo inflingir uma grande derrota ao inimigo, mas, sim a glória e a honra de terem superado seus rivais em coragem e resistência.A poesia era outro orgulho entre os árabes e, através dela enalteciam a guerra, exaltavam a força e a virilidade masculinas, louvavam a generosidade e a hospitalidade e, algumas vezes, falava de amor e romance.

 

A mulher árabe dos tempos pré-islâmicos usufria de uma relativa liberdade. A título de exemplo, para ilustrar a posição ocupada pela mulher nos tempos pré-islâmicos, vale lembrar que Khadija, primeira esposa de Mohammad, uma rica viúva e independente, que administrava seus próprios negócios, foi quem fez o pedido de casamento ao Profeta.

 

Khadija foi a primeira pessoa, do círculo mais próximo do Profeta, a acreditar que as revelações eram divinas e foi a primeira a se converter ao Islam. Até morrer, esteve sempre ao lado de Mohammad, suportou ao seu lado toda a sorte de incompreensões e perseguições de que foram vítimas os primeiros muçulmanos, passou necessidades físicas durante o embargo imposto pelos cidadãos de Meca.

 

Khadija foi a companheira de quem o Profeta jamais se esqueceu enquanto viveu.

Apesar da relativa liberdade de que a mulher desfrutava, esse mundo árabe pré-revelação era patriarcal, moldado pelo homem, e a mulher não passava de uma vítima constante da dor, do sofrimento, da solidão, da humilhação e da exploração física, emocional e sexual. Os árabes de antes da revelação também não escaparam do costume de considerar a filha mulher um peso doloroso, uma fonte potencial de vergonha para o pai, sendo hábito, antes do advento do Islam, a prática cruel do infanticídio feminino.

 

Existia o costume de se enterrar viva a menina, por medo da vergonha ou da pobreza.

 

Quando a filha, sepultada viva, for interrogada: Por que delito foste assassinada? (81:8-9)

 

O Alcorão descreve esta prática, a fim de mostrar o seu horror e registrar o absurdo do costume. Sua condenação cabe perfeitamente com a meta divina declarada do Islam de destruir a ignorância e estabelecer novas regras e preceitos morais, sociais e éticos. No Capítulo 16 “A Abelha”, lemos:

Quando a algum deles é anunciado o nascimento de uma filha, o seu semblante se entristece e fica angustiado. Oculta-se do seu povo, pela má notícia que lhe foi anunciada: deixá-la-á viver, envergonhado, ou a enterrará viva? Que péssimo é o que julgam! (16:58-9)

 

Além de condenar vigorosamente tal prática, o Alcorão não faz distinção entre meninos e meninas.

 

E no Capítulo 17, “A Viagem Noturna”, lemos:

Não mateis vossos filhos por temor à necessidade, pois Nós os sustentaremos, bem como a vós. (17:31)

A ordem social do período pré-revelação, portanto, jamais ajudou a mulher a ter uma condição respeitável e digna.

 

Foi somente com o advento do Islam, que a mulher passou a desfrutar de uma posição dignificada, sem qualquer traço de paternalismo ou exploração, um ser responsável, a quem são exigidos deveres, mas a quem também são assegurados direitos, em igualdade de condições com o homem. Homens e mulheres são criaturas de Deus, e o melhor entre eles é o mais justo, o mais piedoso, independentemente de sexo, raça, cor, posição social etc.. As pessoas se diferenciam no Islam pela fé, pela consciência de Deus e pela conduta reta. Assim, estabelece Deus no Alcorão:

Ó humanos, em verdade, Nós vos criamos de macho e fêmea e vos dividimos em povos e tribos, para reconhecerdes uns aos outros. Sabei que o mais honrado dentre vós, ante Deus, é o mais temente. Sabei que Deus é Sapientíssimo e está bem inteirado. (49:13)

 

O novo modo de vida implantado a partir do Alcorão, assegurou uma posição dignificada tanto para os homens como para as mulheres. As mulheres passaram a ser respeitadas e honradas. A “maldição” do sexo feminino, como herdeiro do “legado de Eva”, portanto, a responsável por todas as desgraças desta vida, deixou de ter sentido. Homens e mulheres são iguais.

 

Nada no conjunto social da Arábia daquele tempo, ou em qualquer outra cultura ou civilização, evidenciou uma tal elevação na posição da mulher. Não foi nenhuma consideração social ou econômica que a tornou necessária ou desejável. Foi antes uma mudança deliberada, feita pelo Islam, por razões que são completamente diferentes daquelas deste mundo e daquelas da sociedade humana em particular. O que a mulher ocidental levou mais de 12 séculos para conseguir, enfrentando as mais duras resistências, o Islam já havia outorgado voluntariamente, tomando a iniciativa, sem submissão a necessidades sócio-econômicas, mas dentro do critério de justiça e verdade, características básicas do Islam.

Se imaginarmos que no século VII, a Europa vivendo em plena Idade Média, que a História qualifica como a “noite dos 1000 anos”, sob o império do pensamento judaico-cristão, onde as mais severas restrições eram impostas às mulheres, onde a mulher era vista como a herdeira do mal, impura, na pequena península arábica surge o Alcorão, assegurando à mulher, primeiro o direito à vida, depois o direito de opinião e expressão, à educação, ao conhecimento, ao testemunho, ao divórcio, à propriedade, à herança, temos que concordar que isso significou uma revolução absoluta nos costumes, tradições e valores que perduravam naquela época e que perduram até os dias de hoje.